Precisamos falar sobre métricas de vaidade
Precisamos falar sobre métricas de vaidade
September 2, 2015Esse texto não é para quem já trabalha com Business Intelligence(ou BI). Esse texto é para quem pede e recebe relatórios de performance em digital/social media. São coisas óbvias para boa parte das pessoas que já trabalham com isso mas que ainda soam como surpresa para alguns clientes.
Eu não sou um cara de BI, mas acho que temos ressaltado algumas coisas irrelevantes em relatórios que vemos por aí. Temos ressaltado métricas de vaidade. Aquelas métricas que não fazem muita coisa para a marca em Social Media. São apenas isso. Mostrar o que fez mesmo que não tenha efetividade ou que ajude na tomada de decisão. É basicamente a mentalidade do “o meu é maior que o seu”.
É normal que no começo de uma plataforma ou de um canal, tenhamos métricas de vaidade. Quando o Facebook nos dava alcance orgânico, ter fãs era importante porque teoricamente você atingia todo mundo. Era a imagem que tínhamos do Twitter até ele abrir as suas estatísticas de acesso dos nossos tweets.
Antigamente um RT era igual a aumentar muito o alcance potencial do seu conteúdo. Tirando as celebridades que são um capítulo a parte porque muitas vezes elas movem multidões mesmo, ter muitos followers não quer dizer que todos vão ver. Um cara com 500 mil seguidores deu RT em um conteúdo meu. Sabe quantas impressões aquele conteúdo realmente teve? Pouco mais de 1000. Sim, impressões. E nem falo de quantas pessoas efetivamente interagiram com esse conteúdo.
Então chegamos naquela clássica frase de efeito que deveria ser lembrada por todo mundo na hora de definir KPIs para qualquer coisa. Já disseram que é do Einstein mas dizem que é do William Bruce Cameron.
Not everything that counts can be counted, and not everything that can be counted counts.”
Ou seja ao invés de ficarmos batendo cabeça e prestando atenção apenas nas coisas simples e fáceis de se ver, porque não procuramos ver com um pouco mais de profundidade?
Listei algumas das métricas padrão que vemos em relatórios e que geralmente passam batido sem ninguém pensar no que isso quer dizer.
Quantidade de fãs no Facebook
Quando não existe alcance orgânico para marcas e se pode falar com todo o Facebook apenas investindo em mídia, quando esse número é importante? Quando você é líder de qualquer coisa fora do Facebook e tem que manter a imagem de líder. É uma estratégia de comunicação da liderança. Não tem nada a ver com efetividade. Só quero compôr a minha marca com a imagem de que sou líder em todos os lugares. É apenas vaidade.
Quantidade de Likes em conteúdo no Facebook
Eu sou um daqueles que acha que Likes deveriam sair do cálculo de taxa de engajamento. Embora no Facebook, likes virem novas histórias (“fulano curtiu isso”), é um esforço pequeno, um retorno em alcance orgânico também pequeno para que possamos usar como referencial. Se cruzarmos Likes e cliques em link, qual a taxa? E Likes e vendas ou downloads? E likes e pessoas que assistiram mais de 70% do vídeo? E likes e produtos e vendas? Talvez haja uma relação interessante para que o like seja relevante, tirando isso, na minha opinião, um post ter um zilhão de likes e nenhum share, não me comove muito. Like pelo Like não é uma estratégia e te deixa míope sobre o que realmente importa para marca. É uma métrica de vaidade.
E aí o que vemos são marcas pensando apenas na quantidade de likes e fazendo conteúdo descartável e que ninguém vai lembrar na semana que vem.
Favoritar algo no Twitter
Não gera novas histórias como o Like no Facebook e tenho a impressão que as pessoas usam de maneira diferente do Like. É meio que mostrar que as pessoas quiseram salvar aquele conteúdo. Não tem nenhum impacto direto na percepção da marca mas as marcas mais espertas usam essa informação cruzam com outros dados para saber o tipo de conteúdo que está funcionando.
Como o Like funciona para qualquer coisa – gostei, concordei, odiei,me emocionei, etc – sua importância e seu peso na hora de avaliar os melhores conteúdos pode ter distorções muito grandes. Já o favoritar no Twitter serve para uma coisa: “gostei tanto que quero salvar e ler depois (mesmo que isso não aconteça, o comportamento me parece ser esse)”.
Compartilhar e Retweet
Em um mundo de alcance orgânico limitado, essa é uma métrica que, na minha opinião, importa muito. Acho que tem tanta gente bitolada em conseguir mais likes que esquece de mirar no conteúdo compartilhável.
Comentários no conteúdo compartilhado
Muitas vezes o conteúdo compartilhado vai acompanhado de algum comentário ou um comentário na verdade é uma indicação para outra pessoa. O que quem faz essas coisas está escrevendo? Estão apenas tagueando as pessoas ou estão acrescentando conteúdo? Será que vale fazer uma word cloud desses textos para ver se eles tem algum padrão?
Acessos ao site (Pageview/visitas)
Sozinho não vale muita coisa. Do que adianta ter um zilhão de acessos e um bounce rate de 99.9%? Acesso sem cruzar com o tempo no site acaba sendo uma métrica vazia. Provavelmente, a única coisa que quer dizer é que a campanha de mídia ou as chamadas estão funcionando muito bem.
Download do app
É bem próximo do acesso ao site. Lembro que no SXSW de 2013 eu vi um cara falando que na média 50% dos apps eram abertos apenas 4 vezes. Será que ter tantos downloads e ninguém usando é uma boa métrica ou é apenas uma métrica de vaidade? Quantos apps você tem no seu telefone e nunca abre? Claro que ser um dos mais baixados na App Store faz bem para sua marca na hora de fazer outro App, se você habilitar notificações também será lembrado no device mas, se o App é gratuito(e não tem estratégia de monetização), a quantidade de downloads sozinha é apenas bom para o ego (e para campanha que você fizer depois)
Views de vídeos
É importante porque é uma métrica que não temos na TV mas o Netflix tem de todo o conteúdo deles. Quanto tempo as pessoas assistem o seu conteúdo? Se todo mundo para na mesma hora, o que isso quer dizer? Se seu vídeo com 1 zilhão de views tem uma vinheta de abertura de 15 segundos e todo mundo abandona o vídeo aos 13 segundos, importa ter tantos views ou é apenas uma métrica de vaidade?
Assinantes no YouTube
É interessante ter porque as pessoas são avisadas quando há um vídeo novo. Então, mal ou bem elas se lembram que você existe. Se o seu conteúdo for bom e atraente as pessoas vão acabar clicando vez ou outra. Mas não se iluda achando que 100% vai ver o aviso ou que 100% é audiência garantida. É uma métrica de vaidade que, assim como as outras, deve ser associada a outros dados.
Likes no Instagram
É a única métrica (junto com comentários) que temos hoje. Então fica meio estranho de falar sobre algo que não seja métrica de vaidade se não sabemos quantas pessoas efetivamente viram o conteúdo. Mas a mesma observação que fiz sobre os likes no Facebook acontecem aqui. Duvido que você lembre os likes que você deu em uma foto do Instagram na semana passada. Só tem acesso a taxa de abertura hoje as marcas que anunciaram no Instagram. Então, o que nos resta são métricas de vaidade e estudar o conteúdo que funciona ali para esse propósito sabendo que é basicamente branding.
Wordcloud
Fazem busca por Carro X da Marca Y e aí quando montam a wordcloud falam com toda autoridade: “Como você pode ver, as pessoas estão buscando pelo seu produto”. Não, você buscou pelas menções do produto e da marca então exclua essas palavras (e suas variáveis) da wordcloud e veja o que realmente importa. Não faz sentido manter os termos da sua busca. É esperado que eles vão aparecer grandes.
Agora, se você está buscando só por carro e a marca e o produto do cliente aparece grande, aí sim você nota algo diferente. E se você cruzar essa informação com os esforços de mídia feitos em todos os canais? E se você cruzar isso com localização e com as vendas dessa região? Eu sei que essas informações de vendas muitas vezes não são divididas com a agência mas outras variáveis são. Wordcloud sem negativar palavras, pode ressaltar impressões óbvias e levar a conclusões superficiais.
Esses são apenas algumas das métricas usadas mas qual o objetivo da marca? Qual o objetivo da marca naquela ação em Social Media? É gerar tráfego para o site? É aumentar o awareness de um produto? É gerar leads sejam eles downloads de app, assinantes de newsletter ou venda mesmo? Já cansei de ouvir grilos (ou respostas como “é tudo isso aí”) do meu interlocutor quando fazia essa pergunta.
Sem ter um objetivo claro para aquela iniciativa, a chance de tudo o que está sendo feito ser apenas ruído e gerar relatórios que também não dizem muita coisa são grandes. Nosso papel como profissionais de comunicação (clientes, agência, etc) é saber (ou definir) um objetivo claro que possa ser medido.
Cruzar dados é básico. Mas saber exatamente que dados cruzar está totalmente associado aos objetivos e momento da marca. Ou seja, nenhum relatório será bom o suficiente se os objetivos da marca não estão claros. Aí as métricas de vaidade acabam sendo a metade do caminho. São números que não contam a história toda e nem medem a efetividade real da ação/campanha/conteúdo.
Se ter muitos likes e views é suficiente para garantir aquele bônus, aquela promoção e, no final do dia, é isso que importa, por que motivo alguém faria mais do que isso e pensaria se isso vale alguma coisa a médio prazo? E é isso que muitas vezes as agências fazem. Reduzem as entregas a uma sombra do que poderiam ser.
O Medium atualizou o seu app e fez uma promoção para quem achasse um novo feature e mandasse pelo Twitter um screenshot e a hashtag #mediumiosupdate. Comunicaram apenas pelas notas do update na App store. Coisa para fãs e geeks que sempre lêem essas notas. Mas foi uma coisa legal de ver as pessoas usarem mais o produto e fazerem propaganda de quase todos os features do Medium para iOS. Pelo que vi foram apenas 120 tweets na promoção mas considerei a ação eficaz.
O prêmio? Uma camiseta. O custo de divulgação? Zero (ou perto disso). Ou seja, há caminhos para serem trilhados se você souber o que você quer. E na boa, podem não ter atingido muita gente mas para os fãs isso foi legal.
Quantas empresas fazem pesquisas antes e depois de uma campanha em Redes Sociais sejam elas de conteúdo ou de mídia para medir se aquele esforço valeu a pena? Dá para isolar o impacto dos esforços de comunicação nas redes sociais nessas pesquisas?
Quantas marcas sabem exatamente de onde vieram suas vendas quando se fala de Redes Sociais? Cruzar o UTM dos links do seu conteúdo com os de acesso ao e-commerce? Porque fazer isso com os de mídia já é o esperado, né? E testes A/B de chamadas de conteúdo, quem está fazendo?
Há alguns anos vi pesquisas feitas sobre o que as pessoas acham da marca no Facebook em que o critério era analisar a página do Facebook de uma marca. Bom, numa delas a única conclusão que eu posso tirar é que ela não deveria ter sido feita. Quem montou a pesquisa não sabe como funciona o Facebook pois tratou como se fosse um site. Os dois primeiros cliques das pessoas foram na foto e no cover photo. Por que estavam medindo isso? Era para excluir quem não sabia usar? No caso, não. Isso só prova que as pessoas não sabiam usar o Facebook. Sem contar que pelo visto esqueceram que há uma questão de que as coisas acontecem no newsfeed e não na timeline da marca.
Mas estavam usando a pesquisa de uma forma viciada, para comprovar um fato. E essa é a grande distorção das métricas de vaidade. Elas passam dados que soam bem aos ouvidos, dão bônus para os gerentes mas não fazem mais nada do que isso. São apenas interações vazias e com pouca análise para tentar melhora-las.
Outra coisa que eu acho curioso são aquelas análises de melhor horário para postar baseado nas interações que determinado conteúdo tem. “Esse conteúdo sobre (assunto que caberia em qualquer horário) funciona melhor de manhã” mas ninguém para e analisa se esse conteúdo já foi publicado em outros horários/dias ou propõe isso. O post funciona melhor porque ele sempre é publicado no mesmo horário/dia. É uma curva normal de vida útil desse conteúdo. Não é como um conteúdo de comida que funciona melhor perto do almoço ou um conteúdo sobre um programa que funciona melhor quando o programa está passando. É algo de cada marca e seus objetivos.
O que parece é que estamos preguiçosos em relação a métricas. Estamos cruzando pouco os dados. Estamos buscando pouco os porquês. Não sei se as sugestões de cruzamentos darão algum resultado que gere uma ação ou que consiga abastecer quem faz o conteúdo de informações mais relevantes do que “Essa editoria dá muito Like quando colocamos foto de produto X”. Isso mais atrapalha do que ajuda. Está na hora de medirmos as coisas de outra forma. Como falei antes, o like pelo like acaba não sendo nada. Está na hora de subir o sarrafo.
Fonte: B9
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